12/06/2009

Uma mulher e um amigo meu…

Aquela sensação de perda, por muito que tentasse a obliterar, era aguda. Ir as compras, o conforto das amigas íntimas e o convívio familiar serviam para abstrair-se um pouco, mas a sua mente não deixava olvidar o João. Tinham namorado pouco menos do que três anos, mas foram os melhores anos da sua vida. Claro que no inicio foi tudo um pouco por acaso, ele convidou-a para sair, ela não tinha grandes expectativas mas gostou dele e lentamente foi crescendo a paixão e o amor. Apesar desta última palavra nunca ter sido pronunciada por ambos, havia ali amor. Um amor geralmente terno e meigo, mas que por vezes transformava-se em sedenta paixão. O João manifestava o seu amor numa base regular mas sem grandes exageros, o que era adequado para ela. Quando ele sentia necessidades mais lascivas conquistava o corpo dela sem ambiguidades e entregavam-se os dois a uma intensa sensualidade. Tudo isto agradava a ela porque João era o amante ideal mas sem ser um pinga-amor.

E agora João abandonou-a. Como era isto possível? Dizia ela para si própria. Será que ele trocou-me por outra? Como foi ele capaz de fazer isso? Realmente não foi só ela que ficou estupefacta, as amigas, os pais dela e dele, os amigos dele, todos ficaram um pouco aturdidos com o terminar daquele namoro. Eram o casal exemplar. Ela era bonita e espirituosa, muito melhor que Joana, a ex-namorada dele, que o traiu com um amigo comum. Parece que a vida dele tinha se endireitado de vez. Ambos tinham completado a licenciatura juntos, e parecia tudo tão bem encaminhado. Mas João partiu para Lisboa sem avisar ninguém, ficou lá duas ou três semanas, quando voltou terminou o namoro, sem grandes justificações ou desculpas. Foi até um pouco brusco, o que não era de todo uma sua característica.

A vida perante os reveses parece inevitavelmente injusta e a sensação de injustiça conduz a revolta. Mas naquele momento não havia nada que ela pudesse acusar o João. Durante o tempo em que estiveram juntos até o rompimento da relação ele tinha sido quase perfeito e embora não houvesse mais nada a fazer do que aceitar o sucedido de cabeça erguida, o que ela queria, ao menos, era uma explicação. Mas como obter uma explicação se ele não queria sequer falar com ela? E mesmo que ele quisesse falar com ela havia outra questão: a humilhação de se dirigir a ele. A relação entre ela e João também baseou-se no pressuposto de que ela era o elemento mais devoluto e resoluto, ela sempre pensou se aquilo acabasse seria sempre pela iniciativa dela e não dele. Mais um motivo para que a acção do João fosse ainda mais incompreensível.

O tempo passou mas aquela dúvida, ou melhor, aquela exigência de compreender o sucedido recresceu ao ponto de provocar insónias. As noites eram, para ela, particularmente difíceis, era consumida por rememorações dos bons momentos passados com João e cada dia que passava a frustração crescia até ao dia que encontrou um antigo amigo, o Carlos.

Carlos foi o primeiro amante dela. A primeira vez que fizeram amor, tinha ela quinze anos e ele dezoito, desde então em certas ocasiões que se encontravam trocavam alguns piropos e algumas piadas privadas e, embora só tinha acontecido duas vezes em oito anos, iam para cama. Sempre que ela se encontrava particularmente vulnerável, Carlos era o ideal encosto. Carlos possuía uma auto-confiança infinita, «capaz de mover montanhas» segundo ela, era também um excelente conversador e bem-humorado. Foi através de Carlos que ela descobriu a resolução do dilema que a consumiu. João tinha descoberto pouco antes de ir a Lisboa e através de um amigo, a relação que ela tinha tido com amigo meu no inicio do namoro de ambos. Isto deixou-o bastante magoado e pálido de raiva porque era segunda vez que acontecia isto a ele.

Este meu amigo contou-me esta história que segundo o próprio protagonista era bastante infeliz. Tinha perdido um amigo - o João - em troco de uma aventura sexual ínvia. Durante aqueles três anos manteve o segredo de ter ido para a cama com a namorada do João, mas num momento estúpido e descuidado revelou o que tinha acontecido e a história acabou por chegar aos ouvidos deste.

Estes desencontros revelam o essencial da natureza humana. Somos capazes de amar e de ir a lua, mas simultaneamente detemos o poder absoluto de destruir tudo o que nos é mais precioso.

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